top of page

AGRICULTOR DO RIO JAGUARIBE E UM ÁGIL SERVENTE DE PEDREIRO.

A volta no tempo do Rio Jaguaribe vai correr por conta da minha criação e de minhas pesquisas. Pois meu velho amigo apresenta-se com orgulho de ter vindo aos 36 anos para o Amazonas. Não fazendo questão de falar sobre seu passado do "Rio das Onças (jaguar) Abundantes (iba)", deu-me asas na imaginação. Um rio "seco" onde feras cruzavam ser precisar nadar.


As margens com fábricas de charque de jumento podem ser pura invenção. Mas não importa aqui a contestação para quem me disse que já trabalhou no ramo.


Admirável é o nome triplo deste amigo "jaguaribense amazônida"! Faz questão de ter os três mais comuns nomes do Ceará. Registrado como Francisco Maria Antônio. Chico do "Padin Padre Ciço" do Canindé, Maria da Mãe Pobre de Jesus, e Antônio dos Peixes da beira do rio.


Moleque das praias e beiradas do rio, era carregador de areia e feliz por dar bons de mergulho nos açudes e poças. Dificil era encontrar corredeiras. Ele se lembra que misturava areia e barro na construção de barracos de taipa. Era uma negação como pescador, nem de peixe miúdo e nem de camarão de água doce. Menino e adolescente que não sossegava de brincar e de rolar nas praias e de mergulhar no rio. Também andava pelas bandas do mar. Brincava com as areias, subia e descia nas dunas trazidas pelo vento. Em dias de ameaça de chuva cobria os olhos e se deixava enterrar, deixando somente os olhos miúdos e as mãos cansadas de plantar mandioca e limpar as ervas do mato. Às vezes, chovia e as gotas surravam seu rosto. Erguia-se com apenas um pulo quando se lembrava do velho morador que lhe contara das onças. Mas diziam para ele que as onças bravas estavam no Amazonas.


Veio para Manaus em busca de um mundo novo, sem saber de muita coisa para ganhar a vida. Tinha hábito da agricultura familiar básica. Embora muito curioso, sempre sonhando com as plantações que se perdessem de vista e um pedaço de terra própria. Aperfeiçoou-se trabalhando nos sítios e tornou-se "fera" para nadar no rio até com os "jacarés". Começou a conhecer Manaus, estradas e igarapés. Atravessou o Rio Negro, fascinado com os barrancos altos e as chuvas fortes, as ondas e os barcos dançando, ancorados nas margens. Gostou de cuidar dos peixes nos pequenos açudes de seus patrões.


Contou-me sobre seus trabalhos, misturando os tempos e os empregos no Amazonas e no Pará. Orgulhava-se de ter aprendido a ser agricultor e plantator de açaí e de batata doce. Ironizava o Amazonas dizendo: “Aqui não tem agricultor”.  Um outro amigo, que escutava a nossa conversa, protestou, mas não chegaram a ir aos tapas.


Apesar de ter plantado 16 mil pés de açaí, o coração trepidava ao falar do tempo que trabalhava na construção civil como servente de pedreiro, mencionando o nome da empresa que trabalhou intensamente por três anos, fechando o ciclo como vigilante do condomínio onde morava seu patrão.


Os pedreiros tinham um pavor do “Sobe Parede” como o chamavam. Certa vez, as betoneiras estavam azeitadas para alta movimentação. Tinha aceitado uma empreitada para abastecer 10 pedreiros que trabalhavam por tarefa. Havia uma grande extensão de muro para erguer. O “Sobe Parede” com o carrinho de mão não parava de abastecer as caixas dos pedreiros. Ficaram sem sossego e tiveram que trabalhar, sem parar, até acabar toda a massa das betoneiras.  


Quando acabou de contar-me essa passagem de sua vida, perguntei: “E hoje, depois e tantos anos de trabalho de plantação e de pedreiro pelejador, sente dores nas costas?". Ele me respondeu: “Não sinto nada e ainda carrego nos ombros um saco de cimento. São os meus olhos que querem apagar”.


Mesmo com os olhos apagando, mantém sua esperança de voltar a enxergar e ver tudo de novo. “Quero ver as flores que eu plantar, os pés de açaí que cultivar, só não vou mexer com cimento porque pode ser a causa da minha cegueira. Disse que tem força de carregar um saco no ombro para quem quiser construir sua casa. "Eu estou sem casa, mas em busca de um lugar para ficar e agradecer meu passado, e viver só, sem a família que já perdi".


Este velho amigo não parava de falar, nem respondia o que eu queria saber para escrever melhor detalhes de sua história e inventar menos, sobretudo do tempo do Rio Jaguaribe, que era o meu maior interesse. Parecia querer esquecer o seu Ceará. Restou contar-me dos outros tempos de "servente pelejador" e de "agricultor esperto", como referia-se a si mesmo. Enfim, sentenciou, tristemente:


Nunca consegui uma terra para dizer que era minha, nem construí minha casa para morar dentro dela com minha família. O cimento condenou meus olhos. Mas sigo com meus 80 anos na esperança."

Olá, que bom ver você por aqui!

Sou um parágrafo. Clique para adicionar o seu próprio texto e editar. Sou um ótimo espaço para que seus usuários saibam mais sobre você.

Fique por dentro de todos os posts

Obrigado por assinar!

  • Facebook
  • Instagram
  • Twitter
  • Pinterest
bottom of page